domingo, 14 de dezembro de 2008

Meu aniversário.

Meu aniversário



Andei às voltas nos últimos dias com o meu aniversário. É que uso o site de relacionamentos orkut e resolvi aderir a um aplicativo onde você anuncia os seus eventos e dirige convites aos amigos. Como além de cético em muitas coisas me acho muito azarado, imaginei que aquela coisa não fosse funcionar comigo. E funcionou. E eu comecei a ficar preocupado.


Costumo fingir que comemoro meu aniversário com os parentes. É assim todo ano. E logro todos eles. Eu os pego pelo mais baixo nível de sentimentalismo. De que estou ficando velho, que tanta coisa há por fazer, que essa vida é ingrata, que as coisas não se resolvem, etc, etc.


Além dessa minha tática funcionar, porque todos me enchem de carinho e presentes interessantes, trato-os como trata Fomá, de Dostoievski, aos seus. Crio armadilhas para chamar a atenção e olho com severidade para alguns, de forma que nada me escape e que eu tenha naquele dia uma noite tranqüila de um deleite de guerreiro vencedor. E é assim que acontece. Rio sozinho no fim. Que maldade.


Agora me vejo cheio de pudor e preocupações. Preciso personificar alguém e criar fatos novos para suportar meu aniversário. Detesto essa cronologia progressiva, que muitos vêm como o caminho sem volta para a morte, quando eu, tenho tanto a fazer. Paradoxo é comemorar o caminho para a morte. Sou pelo fim dos aniversários.


Como fico cada dia mais moço e orgulhoso disso, invisto mais e mais na penteadeira de minha mulher atrás de cremes. Da horta de minha mãe, a babosa. Sou um metrossexual.

Vê lá. Eu falei metrossexual.


Além desses atributos eu pratico meditação. Mas nenhuma das ensinadas pela tal Ana Maria Braga ( é isso, né ? ). É uma técnica milenar egípcia, nada retirado de almanaques. Ah...Adotei o hedonismo também. Para quem acha que o hedonismo é coisa de gente rica, enganam-se. Sou pobre que dá dó. Sou um hedonista-vagabundo. Só porque contei bilhões de dólares é que fiquei com nojo de dinheiro. Não acreditam ? Fiquem com seu ceticismo. Contei, sim, bilhões de dólares.


Não pensem que todo hedonista precisa de dinheiro, que precisa ser milionário. Até porque esses não são hedonistas na integralidade pelo desassossego de ganhar e guardar dinheiro. Eu não. Pra mim, até sexo é prazer. Estão me achando louco ? Não....Vocês não entenderam. Pratico o sexo ``em sendo`` um hedonista. Tiro prazer de tudo. Inclusive de olhar ``coisas`` pela minha janela. Principalmente de rir de certas pessoas.


Mas....o aniversário! É disso que preciso me ocupar agora. Sei que sou um cara estranho e que tem medo de pessoas. Mais ainda se imaginar que no meio de pessoas estejam meus credores, ou pior, inimigos disfarçados.


Decidi que quero todos aqui, ao meu lado. Sirvo um pão com quibe e compro algumas latas de cerveja e fingimos que está tudo bem. Suspeito até, lá no fundo, que alguém declamará poesias para mim...Suspeito também que todos, ao invés de me darem presentes, farão uma doação em dinheiro.

Nada de balõezinhos no teto.


Uma cítara tocando... Jazz... Música de piano...

Ainda não sei...


Tratá-los-ei como diplomatas de outros países.

Ou melhor. Calo-me para ouvir o que todos dizem.

De repente até saio. Antes, porém, sirvo bebidas para ninguém perceber minha retirada.

Ficam com as cervejas e o quibe, e eu vou atrás de mim.

Meia-hora depois, um pouco mais, talvez, eu chego de volta. Já será tempo de notarem minha falta.


Em eu chegando, todos se levantam.

De repente reconheço algumas pessoas e desconheço outras.

Vem-me alguém de muita idade, um velho homem, e me diz:


-Abriram seus presentes...

-O que está acontecendo, pergunto.

-Deram-te tijolos embrulhados.

-Por que ?

-Todos entregaram dinheiro à tua menina.

-Por que, uma vez mais pergunto.

-Não sei. Ninguém demonstrou piedade por ti. Estão assustados, no

entanto.


Como num pesadelo, observo a todos. Mulheres, uns poucos homens e algumas crianças. Um senhor meditabundo, altivo, porém, olha rindo para o chão. Medita o riso. É um caipira.

As crianças que não se assustam mais com o pateta aniversariante voltam às rodas e correrias. As mulheres não ousam me encarar. Enquanto umas dispersam o olhar pela casa, outras dissimulam conversas ordeiras e críticas.


Levanto-me calmamente e dirijo-me à porta. Olho para a rua inundada por um céu escuro de nuvens. Um réstia de sol no horizonte ainda há. Uma réstia muito pequena e inútil.


Tentando recobrar-me, dou-me com uma criança, uma menina esguia e com um rosto de luz.


-Vai sair de novo ?

-Vou ao portão.

-Ainda espera alguém ?

-Não.

-Por que vai ao portão, pergunta-me a menina.

-Não sei...É preciso que o portão fique aberto...




Nunca acreditem em mim. Sou um arlequim de mentira. Um arlequim que mente muito.

Abracem-me. Preciso disso.








Notas esquizofrênicas de rodapé

É penteadeira ou cômoda ?

O nome Ana Maria Braga é mera analogia ao que há de ruim.

Desconsiderem, portanto.

Se considerarem, no entanto, desconsiderem-me, por obséquio.





Teobaldo Mesquita

teobaldomesquita@uol.com.br

2 comentários:

Unknown disse...

METROSSEXUAL????????????????????

Unknown disse...

Li e rê-li...As vezes perco o sono...
Tento entendê-lo, mas você me confunde...
A menina de rosto de luz é o elo que te une a realidade...
Fico triste por não ter feito nada para melhorar a data...Ou ter feito mais...